Ontem
fui ver Moscou e ouvir João Moreira Salles falar de Eduardo Coutinho na PUC. Na mesma
sala 102K em que, há 10 anos exatos, fiz uma matéria eletiva de documentário com
João.
Nesta época, vi um filme que me abalou muito, "Retrato de
Classe". Um filme que fala sobre projeção e realidade, sobre sair da
escola e ir viver a vida. Sobre a classe média, tão pouco retratada
no cinema documentário brasileiro.
Me
vi na tela. Eu estava num momento exatamente anterior ao retratado no filme,
cheia de expectativas e muitos medos. Prestes a sair da escola. (No meio
daquele ano eu me formaria em jornalismo, sem saber muito o rumo que iria tomar).
Eu
estava à flor da pele e tinha que pensar no filme, escrever sobre o filme,
teorizar sobre o cinema brasileiro documental. E eu simplesmente só conseguia
sentir a minha experiência diante da tela.
Foi
ai que pela primeira vez, depois de quatro anos escrevendo textos racionais,
com citações e elaborações, resolvi chutar o balde e escrever uma poesia e
entregar como produto final. Para João Moreira Salles avaliar.
Achei
aquilo muito legal e acho até hoje, até por que sempre tive medo de poesia.
Principalmente
das minhas, claro. Que não são muito de se esconder, o que é certamente um
defeito. Foi para mim uma ousadia.
Mas
foi assim... Escrevi e realmente me despi ali. Lendo hoje vejo toda a minha
confusão da época, minha angustia revelada de sair daquele local quentinho, acolhedor, seguro e criativo
que era a faculdade, para então cair no mundo. Entrar na jaula do leão, sem entender nem
uma fração do que era a realidade. Que medo.
João
tirou dois décimos da nota máxima do meu poema e justificou, além de outras coisas, dizendo que eu
estava colocando muita responsabilidade nos outros para o fim dos personagens do filme. Toda razão.
Mas hoje eu
ainda penso que há motivos também para quem vê responsabilidade no mundo, nas
coisas, na família, na sociedade, para os fracassos. A revolta é justa, ainda acho. Pois a correnteza parece ser mesmo contra. Se não, porque seria tão difícil e raro as pessoas se realizarem
hoje em dia, principalmente no Brasil, e fazerem aquilo que desejaram um dia
quando crianças ou jovens? Mesmo aqueles que não estão na base da pirâmide?
Indo até mais fundo e usando
a referencia de um outro filme, a cena dos adolescente de Santa Marta: duas
semanas no Morro, revela que para outras classes nesse país, nem sonhar é mais
permitido, se revela quase perda de tempo. Marcinho VP estava ali para
testemunhar.
Estar
em um mundo em que a realização da vocação e da felicidade é artigo raro é mesmo triste, mesmo que querer o o oposto seja idealismo pueril. Acho
que foi por isso que me emocionei ao ver o Retrato de Classe, da minha classe, e por sentir que se bobeasse eu iria pelo mesmo caminho.
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