quarta-feira, 4 de junho de 2014

Relembrando o Retrato


Ontem fui ver Moscou e ouvir João Moreira Salles falar de Eduardo Coutinho na PUC. Na mesma sala 102K em que, há 10 anos exatos,  fiz uma matéria eletiva de documentário com João. 

Nesta época, vi um filme que me abalou muito, "Retrato de Classe". Um filme que fala sobre projeção e realidade, sobre sair da escola e ir viver a vida. Sobre a classe média, tão pouco retratada no cinema documentário brasileiro.

Me vi na tela. Eu estava num momento exatamente anterior ao retratado no filme, cheia de expectativas e muitos medos. Prestes a sair da escola. (No meio daquele ano eu me formaria em jornalismo, sem saber muito o rumo que iria tomar).

Eu estava à flor da pele e tinha que pensar no filme, escrever sobre o filme, teorizar sobre o cinema brasileiro documental. E eu simplesmente só conseguia sentir a minha experiência diante da tela.

Foi ai que pela primeira vez, depois de quatro anos escrevendo textos racionais, com citações e elaborações, resolvi chutar o balde e escrever uma poesia e entregar como produto final. Para João Moreira Salles avaliar.

Achei aquilo muito legal e acho até hoje, até por que sempre tive medo de poesia.
Principalmente das minhas, claro. Que não são muito de se esconder, o que é certamente um defeito. Foi para mim uma ousadia.

Mas foi assim... Escrevi e realmente me despi ali. Lendo hoje vejo toda a minha confusão da época, minha angustia revelada de sair daquele local quentinho, acolhedor, seguro e criativo que era a faculdade, para então cair no mundo. Entrar na jaula do leão, sem entender nem uma fração do que era a realidade. Que medo.

João tirou dois décimos da nota máxima do meu poema e justificou, além de outras coisas,  dizendo que eu estava colocando muita responsabilidade nos outros para o fim dos personagens do filme. Toda razão. 

Mas hoje eu ainda penso que há motivos também para quem vê responsabilidade no mundo, nas coisas, na família, na sociedade, para os fracassos. A revolta é justa, ainda acho. Pois a correnteza parece ser mesmo contra. Se não, porque seria tão difícil e raro as pessoas se realizarem hoje em dia, principalmente no Brasil, e fazerem aquilo que desejaram um dia quando crianças ou jovens? Mesmo aqueles que não estão na base da pirâmide?

Indo até mais fundo e usando a referencia de um outro filme, a cena dos adolescente de Santa Marta: duas semanas no Morro, revela que para outras classes nesse país, nem sonhar é mais permitido, se revela quase perda de tempo. Marcinho VP estava ali para testemunhar. 

Estar em um mundo em que a realização da vocação e da felicidade é artigo raro é mesmo triste, mesmo que querer o o oposto seja idealismo pueril. Acho que foi por isso que me emocionei ao ver o Retrato de Classe, da minha classe, e por sentir que se bobeasse eu iria pelo mesmo caminho.

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